Acessibilidade — começando do zero em uma empresa de ensino
Para grande parte das empresas a acessibilidade é um “c@r*lh#, não pensei nisso” no fim de um ciclo de produto ou conteúdo. Mas não precisa — e não deve — ser assim.
Quando entrei na Fluency Academy em março de 2021 para trabalhar com o Memhack, ela tinha entre 70 e 80 colaboradores e como em toda empresa em fase de estruturação, ela tinha seus objetivos claros de crescimento, conquista e solidificação no mercado. Portanto, o tema acessibilidade ainda não havia entrado em jogo para valer em nenhum departamento.
Aqui, relatarei como aconteceu todo o processo de surgimento da acessibilidade na empresa através da primeira guilda da Fluency. Passaremos pelas principais dificuldades enfrentadas por mim como fundador e líder e todos os seus membros, mas principalmente, como conseguimos trazer resultados relevantes em diversos times, desde a evangelização do assunto em alguns deles até mudanças completas de processos da empresa.
O gatilho
Ainda como Product Designer Júnior, eu costumava (e ainda costumo) ler artigos vindos de newsletters de diversos portais de produtos. Em uma manhã qualquer, aproveitei alguns minutos ociosos de trabalho para ler um artigo que me chamou muito a atenção pelo seu título “There’s no such thing as fully automated web accessibility (ou “Não existe acessibilidade na internet que seja totalmente automatizada” em português). Seu subtítulo ainda mais provocativo terminou de acender um alerta na minha cabeça: “Proteja você e sua empresa de comprar um produto ineficaz que diz tornar os sites acessíveis” em tradução livre.
Em resumo, o artigo chama a atenção para empresas que vendem softwares que utilizam inteligência artificial para tornar um site ou produto digital acessível com apenas uma linha de código — e como isso não funciona.
A Anna E. Cook, especialista em acessibilidade relata sobre ser impossível tornar qualquer página acessível com apenas alguns cliques e como na verdade, esse tipo de software está deixando a internet em geral menos acessível — você pode acompanhar uma pesquisa realizada pela WebAIM aqui.
Páginas, aplicativos mobile e demais plataformas e produtos devem ser construídos pensando em acessibilidade desde o início, ao invés de simplesmente sobrepor um código qualquer para que plataformas fiquem magicamente acessíveis. Muitas empresas realmente têm utilizado desses softwares por falta de informação e por confiar na mágica que essas companhias alegam fazer no seu produto.
Páginas e produtos são menos ou mais acessíveis a um ou outro tipo de deficiência.
Algo nunca está com a acessibilidade ligada ou desligada, conforme esses softwares de overlay propõem. Para melhorar esse aspecto, é necessário muita pesquisa, conversa, empatia e tempo de trabalho. Afinal, muitos de nós vamos ficando com algum tipo de deficiência ao longo da vida, seja ela temporária ou permanente e, mesmo se não temos nenhuma, usufruímos de acessibilidade em plataformas sem nem nos darmos conta disso.
Da preocupação com produtos à preocupação com a cultura
Depois de ler o artigo, desesperado, abri o Slack e mandei uma mensagem imediatamente para meu então chefe, Gui Kürten falando algo como:
Gui, acabei de ler um artigo sobre acessibilidade em produtos e estou abismado que ainda não estamos tratando disso aqui. Eu gostaria de começar uma iniciativa para adaptar o Memhack para ser mais acessível e desenvolver as próximas features com esse tipo de pensamento embutido, posso começar a pesquisar mais sobre isso?
Ele me deu sinal verde para começar uma iniciativa e indicou um trabalho que uma colaboradora havia começado há um tempo e por alguma razão não foi para frente.
Ela havia mapeado alguns alunos com deficiência na empresa e conversado com alguns deles, mas conforme o tempo foi passando esse trabalho se perdeu. Entrei em contato com ela e com Jey, o então responsável pelo CS no time de Tech & Produtos, propondo entrarmos em contato novamente com aqueles alunos mapeados para entender melhor como eles estudavam novos idiomas. Assim, nós poderíamos adaptar o Memhack e projetar suas futuras features completamente acessíveis. De início, minha intenção era simples (e ingênua) assim.
Pois bem, montei um roteiro e marcamos chamadas com os alunos. Lembro até hoje, só haviam 11 deles mapeados com apenas dois tipos de deficiência — visual e auditiva — e isso foi o suficiente para virar todo o jogo. O buraco era bem mais em baixo.
A falta de acessibilidade não estava apenas no Memhack. Ela permeava todos os campos da Fluency. Do momento do primeiro contato do aluno com alguém da empresa, passando por dificuldades no cadastro das plataformas, chegando no próprio conteúdo das aulas com os professores, até o momento de memorizar seus aprendizados no Memhack. A situação não estava nada legal.
Uma guilda tomando forma
Depois de sair completamente incomodado da rodada de conversas com alguns alunos com deficiências, resolvi compartilhar os outputs dessas entrevistas com o Gui. Ele por sua vez, me cedeu ainda mais espaço para atuar nesse problema caso eu quisesse: abranger o máximo de times possível em uma iniciativa de melhorar a acessibilidade na empresa como um todo.
Primeiro precisávamos informar e conquistar os líderes em relação à causa. Montei então um template de e-mail para enviar aos managers dos times citados pelos alunos com um objetivo: saber se era possível diminuir aquelas barreiras e se sim, até quando. Conforme suas respostas foram chegando foi possível notar que eles se empenhariam em ajudar na iniciativa.
Montei então uma apresentação e os reuni para explicar melhor o que tínhamos notado, além de explicar que a causa seria também de grande impacto para o negócio: aproximadamente 1/4 da população brasileira e 16% da mundial possuem algum tipo de deficiência. Isso é uma parcela do mercado grande demais para ser ignorada, além é claro, de ir contra a grande missão da Fluency: democratizar a educação no mundo.
Além do mais, em uma pesquisa feita por nós, descobrimos que nenhuma escola online de idiomas relevante no mundo estava prestando muita atenção nesse aspecto.
Durante nossa conversa, ficou acordado que os times citados até então pelos poucos alunos que havíamos entrevistado iriam se comprometer em melhorar os pontos levantados e que formaríamos então um grupo multidisciplinar com um objetivo em comum: tornar os conteúdos e produtos da Fluency Academy cada vez mais acessíveis. Formava-se então o grande objetivo do que se tornou a Guilda de Acessibilidade.
A linha de partida para a empresa
Com o incentivo e permissão dos managers, enviei um e-mail a todos os membros da empresa como forma de chamado para firmar um compromisso: todos os colaboradores deveriam trabalhar em prol da acessibilidade, sendo focais ou não da guilda.
Assim, os focais seriam apenas a interface entre a guilda e o trabalho que a empresa como um todo se comprometia a fazer. Dessa maneira, quem fazia parte da guilda não se sobrecarregaria tanto de trabalho e todos os pontos levantados no trabalho do grupo deveriam ser levados aos times responsáveis por resolvê-los. Os gestores apoiariam as ações cobrando e monitorando-as em seus times.
Para compor o grupo, alguns managers optaram por conversar com seus liderados para saber quem teria interesse em fazer parte do grupo, já outros, indicaram pessoas de acordo com seus próprios critérios (o que veríamos mais a frente que não era uma boa ideia).
Outro ponto de atenção que perceberíamos depois é que as pessoas que estavam entrando na guilda de início a enxergavam como um grupo de discussão, e não de trabalho. Abordarei isso com mais detalhes adiante.
Pois bem, depois de iniciar as nossas conversas com os alunos com deficiência nós não paramos mais. A guilda teve diversas configurações ao longo da sua vida e nós tocamos o trabalho como deu. Fomos adaptando ao longo do caminho.
De início tínhamos encontros semanais de uma hora com representantes de dois times apenas — Tech & Produto e Customer Success. Conforme nós conversávamos com os managers de outros times e as pessoas viam nosso trabalho, colegas de outras áreas também se interessavam com nossa atuação e causa, buscando se informar e tornar-se focais de seus times dentro da guilda. Assim, começamos a atrair mais pessoas que se interessavam por conta própria para fazer parte da guilda.
Como começou o trabalho na guilda
Primeiramente é necessário entender o porquê de termos definido o objetivo da guilda como ficou: tornar qualquer produto ou conteúdo acessível a todas as pessoas é algo extremamente difícil (até impossível, eu diria).
Sempre há a possibilidade de alguém com características específicas acabar ficando de fora de qualquer mapeamento.
Portanto, afirmar que vamos deixar qualquer coisa completamente acessível é mentira, mas perseguir esse ideal utópico todos os dias pode nos ajudar a melhorar constantemente sem correr o risco (inclusive jurídico) de afirmar algo que não é. Principalmente se levarmos o termo “acessível” ao pé da letra.
Começamos então com os pontos que já havíamos registrado das conversas com os alunos com deficiência. Muitos deles além de relatar as barreiras que enfrentavam e como as contornavam, deram também dicas de ações simples que já os ajudariam demais.
Um bom exemplo é o cronograma das aulas que era montado com imagens dentro de um PDF e os leitores de tela obviamente não conseguiam interpretá-los sem alt-text.
Uma sugestão extremamente simples dada por um deles foi escrevê-los em um documento de texto qualquer em que todas as informações relevantes estivessem em uma ordem que fizesse sentido para que o leitor pudesse funcionar.
Transformamos todos pontos levantados por eles em acionáveis documentados e endereçamos aos times responsáveis por cada ação. Uma página da guilda no Notion se tornou nosso repositório e board oficial de trabalho. Registramos o script com todas as respostas das conversas que tivemos com os alunos e continuamos fazendo o mesmo com as conversas que aconteceram depois. Conversar com eles era fascinante e nos trazia insights imensos!
Não te causa uma curiosidade imensa saber como uma pessoa com deficiência auditiva ou visual aprende um novo idioma? Em mim causou!
Como cada ação variava de time responsável e cada um tinha uma metodologia de trabalho diferente, os focais eram responsáveis por levar as ações aos seus times para que eles as executassem da maneira em que achavam mais eficiente e conveniente. A guilda não teria autoridade para ditar regras de como cada time trabalharia.
Nossas reuniões eram basicamente follow-ups, em que conversávamos abertamente sobre o status de cada ação, checávamos se alguém precisava de auxílio e definíamos estratégias para conseguirmos executar todos os pontos dadas as especificidades de cada contexto e modelo de trabalho.
Conforme as conversas se desenrolavam, começamos a sentir a necessidade de quebrar as ações em porções menores, criando assim um Kanban na página inicial da guilda para acompanharmos cada uma delas.
Cada focal era dono de seus cartões e eles mesmos deveriam atualizá-los com comentários, checklists, descrições e movimentações entre colunas. Conforme cada microação era finalizada, conseguíamos ter uma visualização melhor da evolução de cada grande ação, mas nem sempre as coisas fluíam bem.
No geral, os membros recorriam uns aos outros para elaborar uma apresentação ou uma documentação, por exemplo, mas haviam momentos que precisávamos do apoio de alguns managers e quando sentíamos alguma dificuldade, recorríamos aos dois principais compradores da nossa ideia: o Gui Kürten, que me cedeu espaço para começar isso logo no início e o Namiki, que tinha vindo do Nubank para ser CTO na Fluency, trazendo consigo experiências parecidas e muita vontade de fazer acontecer. Ambos do time de Tech & Produto.
O fluxo de trabalho
Conforme fomos conversando, trabalhando e nos adaptando as adversidades finalmente conseguimos perceber um fluxo simples claro de trabalho que funcionasse para a guilda:
- O time de CS mapeava as pessoas com deficiência e/ou transtornos que influenciam no aprendizado através de questionários no cadastro do aluno na plataforma principal da Fluency;
- O time de CS posteriormente guiava conversas recorrentes com os alunos mapeados e registrava as barreiras;
- A guilda debatia sobre os insights levantados nas conversas, registrava as ações e endereçava aos focais dos times;
- Eles por sua vez, levavam as ações aos seus times que as executavam e;
- Realizávamos follow-ups de todas as ações e traçávamos rotas alternativas quando alguma ação não estava evoluindo como deveria.
Esses passos se repetiam constantemente sem a necessidade de uma periodicidade determinada e fixa. Dessa maneira a guilda funcionou por um ano, sempre com adaptações ao longo do caminho e melhorias quando necessário.
Apesar de termos identificado esse fluxo de trabalho que funcionava pra gente, algumas coisas ainda não estavam legais.
Nos primeiros 6 meses de funcionamento a rotatividade de membros era alta por alguns motivos já citados: muitos haviam sido indicados sem estar verdadeiramente interessados nas ações e sem nenhum retorno claro por parte da empresa ou de seus chefes, acabavam saindo rapidamente.
Outro motivo é que alguns colegas percebiam depois de algumas reuniões que haviam entregáveis envolvidas no trabalho, ao invés de apenas debatermos sobre acessibilidade. Assim, com seus horários já ocupados com outros trabalhos, percebiam que não seria viável continuar e também nos deixavam.
Meu papel na guilda
Durante o tempo que a guilda funcionou, além de ter tido a iniciativa eu desempenhei algumas outras funções como líder (que acabou acontecendo por acaso).
De início minha intenção era que não tivéssemos nenhuma figura de liderança, mas que conseguíssemos todos correr atrás do que era necessário para que cumpríssemos nossos objetivos com autonomia total. Porém, conforme fomos enfrentando dificuldades eu acabei abraçando diversos papéis fundamentais para dar continuidade no nosso trabalho:
- Monitorar o progresso das ações: de tempos em tempos era possível perceber que algumas pessoas não estavam se comprometendo ou dando continuidade em certas atividades. Semanalmente eu acompanhava o status de todas as microações e conversava com cada um no privado de forma assíncrona, buscando saber primeiramente se estava tudo bem com aquele focal, o que estava acontecendo com aquela ação e como poderíamos ajudar ou tentar executá-la de outra maneira buscando ajuda se necessário.
- Marcar reuniões: como eu disse acima, a guilda teve diversas configurações durante seu período de funcionamento. De acordo com o feedback dos focais e com algumas percepções as reuniões mudavam de periodicidade e duração, por vezes sendo semanais de 1h e em outras, quinzenais com duração de 1h30.
- Conexão com gestores: como a guilda começou com uma iniciativa vindo de baixo na hierarquia, em diversos momentos precisávamos de alguém que tivesse comprado a ideia em níveis bem acima dos nossos. Nesses momentos é que eu conversava com eles para facilitar a execução das ações pelos times.
- Guiar follow-ups: durante nossas calls eu era o responsável por iniciar as conversas e conduzi-las, sempre de maneira respeitosa, tentando entender ao máximo a situação e o momento de cada um e puxando o foco do time para o que era importante, além de auxiliar na organização do Kanban e registrar pontos importantes.
- Controlar a presença: como a rotatividade da guilda foi muito alta por alguns meses, era necessário eu fazer o controle da presença dos focais nas reuniões para correr atrás de saber se a aquela pessoa estava bem e se precisávamos de um novo representante do seu time no nosso grupo de trabalho.
- Buscar por novos membros: tanto quando nos deparávamos com uma barreira de acessibilidade relacionada a um time que não possuía focal na guilda quanto quando alguém se afastava, geralmente eu buscava conversar com manager do time em questão para avisar que precisávamos de alguém de lá conosco e para quê.
- Monitorar pontos de atenção: ao perceber alguma dificuldade extra ou uma demora além do limite em alguma ação, eu sempre trazia ao grupo para que pudéssemos debater em conjunto e encontrar uma melhor maneira de resolvê-la.
Bom, acredito que deve ter sido possível perceber que não foi nada fácil começar e conduzir essa iniciativa dados todos os pontos de atenção já citados. Além disso, eu ainda era um dos focais do meu time junto com o Jey.
Depois de mais ou menos um ano de guilda, percebemos que estávamos chegando num ponto em que precisávamos passar para uma nova fase e trocar de casca, mas isso não estava sendo nada simples.
Perdendo velocidade
Já sentindo muita dificuldade de destravar algumas ações que estavam paradas há meses em diversos times e sentindo muita frustração com isso, conversei como Namiki para buscar ideias de soluções para esses problemas, já que ele havia participado de uma experiência relacionada a acessibilidade no Nubank e poderia me dar insights.
O que recebi desse contato foi uma aula de liderança e humanidade. Depois de externar minha frustração abertamente e explicar como era o nosso trabalho, o CTO me deu uma ideia que eu ainda não havia tido: fazer uma reunião 1:1 com cada membro da guilda e entender bem mais a fundo os seus contextos e pontos de vista em relação ao trabalho no grupo.
Montei então um script para entender:
- O momento de vida pessoal deles (caso se sentissem a vontade em compartilhar): assim eu conseguiria saber se algo mais importante que o trabalho estava atrapalhando seus desempenhos para não ser injusto com ninguém;
- O contexto de trabalho geral: o que eles realmente faziam em seus cargos no dia a dia;
- Como eles levavam os trabalhos da guilda para seus times e principais prioridades;
- Como era a relação com seus chefes imediatos e não imediatos (caso se sentissem à vontade também);
- Como eles achavam que a guilda poderia prosperar e;
- O que eles achavam da minha gestão e o que eu poderia melhorar como líder.
Com algumas semanas consegui realizar todas elas e o resultado foi surpreendente: precisaríamos mudar nosso modo de trabalhar e passar para uma nova fase e rápido. Nossa casca já não nos suportava mais.
Todos os focais da guilda estavam frustrados da mesma maneira que eu, mas eles sentiam a uma dificuldade muito grande de fazer com que seus times executassem as ações e as priorizassem de alguma maneira.
Eles não conseguiam pela falta de autoridade deles em seus times e em muitos momentos por seus líderes estarem já bem ocupados com outras tarefas.
Como toda a iniciativa aconteceu bottom-up, todo o nosso trabalho e principalmente o meu era super árduo até que chegasse em outras pessoas. Para piorar, nem todos os líderes estavam se dedicando ou ao menos demonstrando alguma preocupação com nossas ações da guilda.
Assim, o que acontecia era que nós planejávamos ações maravilhosas para melhorar a vida de muita gente, mas na hora disso ser executado pelos times, nós não tínhamos o apoio necessário para que as ações fossem para frente. E assim, elas ficavam paradas no Kanban follow-up após follow-up, mês após mês. A frustração era certa.
A única solução trazida por todos e que inclusive já havia sido levantada nos follow-ups foi: incluir as ações nos ORKs de cada time. Mesmo que não fosse para o próximo quarter. Assim, a decisão viria top-down e os líderes teriam uma motivação a mais para que seus times as cumprissem.
Muitos não tinham uma relação muito próxima com seus chefes como eu e o Jey tínhamos com o Gui e isso também dificultava o alinhamento com o que deveria ser feito.
Alguns relataram inclusive que a Guilda de Acessibilidade era a maior motivação de trabalho que eles tinham na Fluency naquele momento e que minha liderança inspirava a continuar trabalhando no projeto apesar de estarem perdendo drasticamente a satisfação.
Ao levar os resultados das 1:1s para o Gui, chegamos a uma conclusão: a empresa não estava no momento correto de levar essas ações para frente como definimos como ideal. Sendo assim, decidimos congelar todas as atividades da guilda e apresentar os resultados para todos os times na reunião geral da empresa. Foi como perder um filho para mim, mas era o que dava para fazer no momento.
Resultados e impactos
Apesar de não ter tido o final que eu esperava naquele período, listar seus resultados me fez perceber que tudo valeu a pena. Deixo aqui todos os que conseguimos lembrar, separados por times e suas condições até que eu deixei de fazer parte da empresa:
Product, Tech & Data
- Treinamento de todo o time de CS: mostrar ao time de Customer Success como contornar as barreiras tecnológicas de acessibilidade nos produtos até que terminássemos o nosso trabalho melhorando-as;
- Testes com alunos com deficiência no Memhack Legacy e atual;
- Criação de guia de design de produto acessível (em andamento);
- Documentação de acessibilidade do Kajabi (plataforma de cursos usada até então) e Memhack Legacy e;
- Inclusão do tema de acessibilidade no onboarding para os novos membros do time.
Creative Launch
- Accessibility news: pílulas de acessibilidade enviadas ao time periodicamente;
- Materiais para alunos acessíveis — ESOL (English for Speakers of Other Languages): em andamento;
- Orientações para equipe de ESOL e de Índia para deixar os cursos mais acessíveis desde sua concepção: PDFs, aulas, plataforma;
- Inclusão do tema de acessibilidade no onboarding para os novos membros do time e da Fluency Academy como um todo;
- Conversa com os gerentes de estudos sobre acessibilidade, tipos de deficiência já mapeadas e maneiras de lidar com esses alunos;
- Melhorias nas fontes nas aulas de lançamento.
Marketing & Social Media
- Manual de acessibilidade para social media: como produzir conteúdo e fazer posts mais acessíveis;
- Alt-text em todos os conteúdos estáticos postados;
- Inclusão da #ParaTodosVerem de identificação dos professores e contexto dos vídeos;
- Utilização de ferramenta de transcrição de vídeos (em andamento) e;
- Inclusão do tema de acessibilidade no onboarding para os novos membros de Social Media.
Customer Success
- Treinamento com o time para compreender as demandas dos alunos, entregando um atendimento personalizado ao longo dos seus estudos;
- Mapeamento de alunos com deficiência e/ou transtornos de aprendizado no cadastro;
- Mapeamento de dificuldades desses alunos e direcionamento mais eficiente aos gerentes;
- Conversas com alunos já mapeados com deficiência/transtornos de aprendizagem e difusão dos feedbacks aos demais times;
- Aumento significativo na fidelidade de dados em relação à alunos com deficiência e;
- Mapeamento de 325 novos alunos com deficiência e/ou transtornos entre 26/05/22 e 22/07/22 (lembra que no início só tínhamos 11 mapeados ao todo?).
New Businesses and Courses
- Glossário anticapacitista sobre inclusão, acessibilidade, linguagem e luta contra o capacitismo (em conjunto com Creative Launch);
- Diretrizes das lives para torná-las mais acessíveis (em conjunto com Creative Launch);
- Debates sobre linguagem e contraste de cores nos materiais didáticos;
- Debates e estudos sobre como melhorar os alt-texts;
- Maior awareness sobre deficiências e inclusão e;
- Inclusão do tema de acessibilidade no onboarding para os novos membros do time.
Brand & Design
- Auxílio na criação de diversos documentos mais acessíveis;
- Criação de novo modelo de cronograma acessível (em validação);
- Estudos de níveis de contrastes das cores da Fluency Academy e regras de uso e;
- Implementação do assist toolbox no lançamento do Fluency Hackers (um dos maiores eventos da empresa).
Gostaria também de dar um destaque especial aos resultados conquistados pelo time de CS, que reestruturou processos completos para que alunos com deficiência e/ou transtornos que influenciam na aprendizagem pudessem ser mapeados ainda em seus primeiros contatos com a Fluency, facilitando e muito todo o processo do levantamento de barreiras que devem ser diminuídas na jornada de aprendizado dos alunos.
Esses processos se tornaram cíclicos, eficientes e eficazes para que toda a empresa tenha ciência e disponibilidade de dados relevantes sobre esse aspecto a qualquer momento com agilidade. Isso foi incrível!
A semente plantada e um novo começo
Dadas as diferenças de gestão de cada time e a falta de controle minha e dos dois principais líderes apoiadores da guilda sobre eles, me foi apresentada uma proposta feita pelo Namiki logo após congelarmos as atividades da guida: liderar como Product Manager um squad específico de acessibilidade dentro do time de Tech & Produtos.
Durante um evento presencial de tecnologia da empresa, já como Product Manager, debatemos sobre como trataríamos a acessibilidade no time e chegamos a um novo ponto. Além de levar em consideração as deficiências e transtornos que influenciam na aprendizagem, levaríamos em consideração um outro aspecto da acessibilidade: o acesso no contexto mais geral da palavra, levantando questões como:
1. Como as pessoas acessam os conteúdos da Fluency? Por que alguns deles não os acessam?
2. Eles são acessíveis em termos de qualidade de conexão média em regiões pouco mapeadas?
Assim, abordaríamos temas como performance de páginas e plataformas, consumo de dados e novas maneiras de levar o ensino da Fluency a locais onde as pessoas não conseguiam acessar. A estruturação e documentação do squad foi montada por mim com o auxílio do Gui para começarmos os nossos trabalhos no time até que a demissão em massa ocorreu e deixei de atuar na empresa.
Hoje já não sei mais como anda um assunto tão importante e relevante (de diversas maneiras) na Fluency Academy, mas espero muito que não só ela quanto todas as empresas do mundo se preocupem com esse aspecto e criem iniciativas que possam dar a mesma oportunidade àqueles que não a têm hoje.
Agradecimentos
Agradeço especialmente o Gui, que acreditou em mim desde o início e me cedeu tempo de trabalho, ao Jey que ficou do meu lado durante toda essa jornada e a todos os outros, que, sem bônus financeiro, com dificuldades e frustrações e muitas vezes sem tempo e sem o devido reconhecimento, continuaram do meu lado trabalhando por um ano na luta para um mundo um pouco melhor a cada dia.
Faço questão de citar aqui todos os seus nomes. Muito obrigado, Becca, Duane, Babi, Mona, Bia Hamad, Gabi Mirian, Manu Calisto, Aline Louise, Rodrigo Taques e Jhonatan.
Conecte-se comigo no LinkedIn e vamos trocar uma ideia, que tal? 😉